Juiz Insensato
Magabi Eynew Gessesse
Brian Wambi

Era uma vez dois vizinhos pobres que eram amigos. Um dia, um deles disse ao outro: "Hoje, tenho de levar a minha cevada ao mercado. O saco está muito pesado e o mercado fica longe. Quem me dera ter dinheiro suficiente para comprar um burro."

1

O vizinho anuiu e disse:  "E eu, hoje, tenho de comprar umas panelas novas no mercado. Mas elas são muito pesadas. Quem me dera também ter um burro. Só tenho metade do dinheiro."

2

O primeiro homem teve uma ideia. "Vamos comprar um burro juntos. Tu pagas metade e eu pago a outra metade. Uma semana, levo eu o burro ao mercado e, na outra, podes levá-lo tu." Compraram um burro. Durante muito tempo, andaram ambos felizes.

3

Mas, um dia, o pai do primeiro vizinho morreu. O homem ficou com as terras, as árvores, as vacas e as ovelhas todas do pai. Agora era rico e não queria trabalhar mais com o homem pobre. E quis a sua metade do burro.

4

Disse ao vizinho: "Os meus cães precisam de carne. Quero matar o nosso burro. Podes ficar com uma metade e eu fico com a outra." O homem pobre gritou: "Eu não preciso de carne nenhuma. Preciso é do burro. Se queres matá-lo, dá-me dinheiro pela minha metade." O vizinho ficou zangado."Não te dou dinheiro nenhum", disse ele. "Metade do burro é meu e eu quero a minha metade." "Vamos ter com o juiz", disse o homem pobre. "Ele que decida por nós."

5

Os dois vizinhos foram falar com o juiz. O juiz não era um homem sensato. Não ouviu com atenção. "São ambos donos do burro?" perguntou ele. "Sim", confirmaram os homens. "Então, metade pertence a um e a outra metade pertence a outro," disse o juiz. "Se o homem rico quer a metade dele, pode ficar com ela. Matem o burro e cortem-no ao meio."

6

O homem rico ficou feliz. Matou o burro e levou metade da carne para dar aos cães. O homem pobre ficou infeliz e pensou: "O meu pobre burro foi-se e agora tenho de carregar eu tudo."

7

Uns meses depois, o homem rico quis construir uma cabana nova. "Vou queimar a minha velha cabana e construir uma nova, grande e boa", pensou ele. Começou a carregar tudo para fora da cabana. O homem pobre viu-o e perguntou: "O que estás a fazer?" "Vou queimar a minha cabana e fazer uma nova," disse o homem rico."Mas a tua cabana fica ao lado da minha", disse o homem pobre. "Se queimares a tua cabana, queimas também a minha."

8

O homem rico ficou zangado."Não tentes impedir-me!" disse ele. "Esta cabana é minha e posso queimá-la, se eu quiser." "Para!" gritou o homem pobre. "Vamos perguntar ao juiz." O insensato juiz não ouviu com atenção nem tentou compreender. "O homem rico pode queimar a cabana, pois é dele e ninguém pode impedi-lo," disse o insensato juiz.

9

Então, o homem rico queimou a sua cabana. O vento levou o fogo para o telhado da cabana do homem pobre que depressa começou também a arder. "Olhe!" gritou o homem pobre para o juiz. "O meu vizinho queimou-me a cabana! Tem de me pagar." "Não," disse o juiz. "O seu vizinho queimou a cabana dele. O fogo é que queimou a sua. O seu vizinho pode ficar com o dinheiro."

10

Então, o homem pobre ficou muito infeliz. Não tinha cabana nem burro. Tudo o que tinha eram as suas terras. Todos os dias, trabalhava nas suas terras. Todas as noites, dormia debaixo de uma árvore.

11

Estava quase na altura das colheitas. O homem pobre tinha trabalhado arduamente nas suas terras. Arrancara as ervas daninhas. Afugentara a passarada. Tinha uma boa colheita de grão-de-bico nas suas terras.

12

Um dia, os filhos do homem rico foram visitar o pai. Passaram pelas terras do homem pobre. "Grão-de-bico!" gritaram eles. "Olha, é delicioso!" Correram para as terras e começaram a comê-lo. Depressa o grão-de-bico desapareceu todo.

13

O homem pobre viu-os de longe. Correu rapidamente para as suas terras. "Devolvam-me o grão-de-bico," pediu ele. "Não podemos devolvê-lo," disseram eles. "Comemo-lo. Pede ao nosso pai. Ele paga-te o grão-de-bico."

14

O homem pobre foi falar com o homem rico. "Os teus filhos comeram-me o grão-de-bico todo," disse ele. "Vou dar-te algum dinheiro para to pagar," disse o homem rico. "Eu não quero o teu dinheiro. Quero é o meu grão-de-bico," disse o homem pobre. "Espera! Vamos perguntar ao juiz," gritou o homem rico.

15

Os dois homens foram falar com o juiz. O juiz não os ouviu com atenção nem pensou no caso deles. "Os filhos do homem rico comeram-lhe o grão-de-bico todo," disse ele ao homem pobre, "e têm de lho devolver. Esventre-os e recupere o seu grão-de-bico." O homem rico ficou muito assustado. "Mas assim os meus filhos morrem!" disse ele. "Por favor, vizinho, deixa-me dar-te dinheiro." "Eu queria dinheiro quando mataste o nosso burro", disse o homem pobre. "Agora não o quero. Quero é o meu grão-de-bico."

16

O homem pobre pegou na sua faca. "Eu construo-te uma cabana nova!" disse o homem rico. "Desculpa ter-te queimado a velha." "Eu não quero uma cabana nova," disse o homem pobre. "Quero é o meu grão-de-bico." Começou a afiar a faca numa pedra. "Não! Não! Por favor, espera!" gritou o homem rico. "Vamos falar com os anciãos. Por favor, meu velho amigo, deixa que os anciãos decidam."

17

Então, os dois vizinhos foram falar com os anciãos. Os anciãos conversaram durante muito tempo e, por fim, disseram ao homem rico: "Fizeste mal. Recusaste-te a pagar ao teu vizinho pelo burro, queimaste-lhe a cabana e os teus filhos comeram-lhe a colheita."

18

Depois, viraram-se para o homem pobre. "Tu queres matar os filhos do teu vizinho. Isso também está mal. Eis a nossa decisão: o homem rico deve dar ao homem pobre metade de todas as suas árvores, terras, vacas e ovelhas. Depois, poderão viver juntos em paz."

19

Então, o homem rico deu ao homem pobre metade de todos os seus bens. E viveram juntos e felizes. Nunca mais discutiram.

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Juiz Insensato
Author - Magabi Eynew Gessesse, Elizabeth Laird
Translation - Translators without Borders, Paula Amaral
Illustration - Brian Wambi
Language - Portuguese
Level - Read aloud